Moradores com transtornos mentais: como agir?

Síndicos devem estar cientes das questões legais e éticas que regem o assunto para poder agir em situações que envolvam a coletividade condominial

Os desafios dos síndicos no dia a dia dos condomínios são muitos. E entre eles está a forma de atuação em eventos que envolvem pessoas com transtornos mentais. De acordo com dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) de 2019, cerca de 23 milhões de brasileiros apresentam sintomas de transtornos psiquiátricos. E destes, ao menos 5 milhões sofrem com quadros mais graves, sendo que muitas destas pessoas vivem em condomínios e não é raro ouvir relatos de crises dentro das unidades ou nas áreas comuns.

Como o que aconteceu com o síndico profissional Cléber Pereira da Silva, que há 9 anos atua em Brusque (SC). No último episódio registrado em um dos empreendimentos que ele administra, um morador com esquizofrenia desceu do apartamento e ficou aos gritos na frente do condomínio, pois acreditava que o prédio estava caindo. Com isso, muitos condôminos – que não sabiam do diagnóstico – entraram em pânico ao acreditarem que estaria acontecendo um desabamento. O grupo chegou a chamar os bombeiros, que foram até o local e constataram que não passou de um alarme falso.

“Em casos assim, o primeiro passo é conversar com a família para entender qual é o transtorno e em conjunto traçar um plano de abordagem aos demais moradores. Afinal, a humanização e o respeito ao próximo devem vir em primeiro lugar. Além disso, é muito importante que todos saibam, até mesmo para que possam ajudar e dar um suporte em caso de novas crises ou evitar ainda mais mal-estar para a pessoa”, explica Silva. Responsável pela gestão de 13 condomínios na cidade, ele diz que o papel do síndico nesses casos é de facilitador e não o de julgar ninguém.

Ideia compartilhada pela psicóloga Marina Corbetta Benedet, professora da Univali no Campus de Itajaí (SC). Ela lembra que a experiência que aquele morador está vivendo para ele é verdadeira. Por isso, a abordagem deve ser para acalmar e não contrariar, tentando convencer que aquilo não é real.

“Diante de situações críticas, nós não devemos dizer que aquilo não está acontecendo, mas sim acalmar a pessoa. É importante conversar para que ela fale o que está vendo, ouvindo e o que quer fazer. Esse é um dos caminhos para acessar a pessoa em caso de crise”, explica a especialista. Paralelo a isso, também é preciso acionar aqueles que vão poder dar uma intervenção médica de urgência, como Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) e Bombeiros, os quais recebem treinamento específico para lidar com essas situações.

E no caso dos autistas?

Outro grupo que enfrenta diariamente o preconceito são o de pessoas com Transtorno de Espectro Autista (TEA). Ou seja, um distúrbio do neurodesenvolvimento caracterizado por comprometimentos em linguagem, comunicação, comportamento social e inteligência.

Segundo a OMS, hoje essa condição atinge uma em cada 160 crianças no mundo e 2 milhões de pessoas só no Brasil. E mesmo assim, o autismo ainda é visto como um tabu. Tanto que as pessoas tendem a ter uma visão errada das reais necessidades da pessoa com TEA.

Em muitas situações, crianças e adultos apresentam uma hipersensibilidade à luz ou a sons mais altos, como no caso relatado por Fabiane Horst Bocardi, proprietária de uma administradora que presta assessoria a empreendimentos em Brusque. Em um dos condomínios em que ela atua, há um menino que tem autismo e ele não suporta gritos ou qualquer outro tipo de barulho mais alto. Para ajudar, a administração e os demais condôminos uniram-se em uma corrente do bem.

“Entre as medidas adotadas com os demais moradores está o pedido para que evitassem ao máximo batidas, principalmente à noite. Isso tudo para ajudar a família nos cuidados da criança”, relata. Com mais de 25 anos de atuação na área condominial, ela diz que tem sido cada vez mais recorrente a busca por orientação nesse sentido.

Garantias legais

Para a advogada condominialista Caroline Rossetti Gruber, membra fundadora da Associação de Síndicos de Balneário Camboriú (ASBALC) e diretora estadual em Santa Catarina da Associação Nacional da Advocacia Condominial (ANACON), a vida em condomínio exige tolerância. Não é novidade para ninguém que é direito de todos a manutenção de qualidade de vida saudável, com uma convivência pautada no bom senso e respeito ao direito alheio.

Dessa forma, para a especialista, aos condomínios cabe o dever social de promover a acessibilidade aos seus ambientes e, ao síndico, representante legal do espaço, a obrigação civil de fazer valer tais direitos e coibir qualquer tipo de omissão. Além disso, os condôminos têm o dever moral de dar efetividade a tais atitudes e comportamentos.

Além dos direitos previstos e garantidos pela Constituição Federal, Gruber destaca ainda que é preciso respeitar o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), em casos que envolvam menores de idade, e o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015), o qual busca promover os direitos e liberdades fundamentais da pessoa com deficiência e sua inclusão social, em condições de igualdade com os demais.

Nesses casos, ficam assegurados os indivíduos que têm algum tipo de impedimento de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, onde a interação com uma ou mais barreiras pode obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade. Lembre-se, aliás, que transtornos mentais vão desde uma depressão, ansiedade generalizada, até quadros de desconexão com a realidade, como no caso da esquizofrenia.

Como proceder

Em condomínios, muitos são os relatos de condôminos em crises e que provocam agressões físicas e verbais, corrida pelos corredores ou até mesmo que colocam fogo na própria unidade, pondo em risco o sossego, a saúde e a segurança de todos. Dessa forma, a advogada orienta que, no caso do morador que já possui diagnóstico psiquiátrico conhecido (que seja esquizofrenia ou transtorno bilateral), o contato de um parente próximo para acionar em caso de surto é extremamente importante.

Já nas situações em que não se saiba do quadro de saúde, importante é o contato com o familiar ou com o responsável pela unidade, relatando o problema imediatamente. Ao mesmo tempo, deve-se acionar o SAMU para que a pessoa tenha um pronto atendimento. Em caso de surto de maior gravidade, com violência física, por exemplo, há uma maior dificuldade de controle da situação. Logo, é preciso mais agilidade. Ocorrendo em área comum, ao síndico cabe o acionamento da Polícia Militar para conter o evento e, se necessário, esta acionará outro tipo de atendimento.

“Uma observação importante é o treinamento prévio dessas condutas especialmente junto aos funcionários do condomínio, que a partir das orientações poderão adotar postura mais rápida e assertiva. Além disso, a conscientização de todos os moradores também faz diferença nesses casos, tratando-se o evento com maior foco e intervindo com resolução. Campanhas com informativos nos elevadores trazem bons resultados e alcançam grande público”, exemplifica Caroline.

Sobre as medidas internas cabíveis ao síndico após avaliação do caso em si, ela explica que o proprietário da unidade é o responsável legal pelos danos. “Nesse norte, o gestor deve buscar sua assessoria jurídica e enquadrar o caso conforme regimento interno, convenção do condomínio e Código Civil. A vítima pode adotar providências aos problemas de ordem criminal”, salienta a advogada.

Negligência nos cuidados

Além disso, havendo indícios de negligência da família nos cuidados com a pessoa com transtornos, Caroline lembra que não só o síndico, mas qualquer cidadão pode e deve acionar os órgãos de proteção à vida e à dignidade da pessoa, tais como: Ministério Público, Defensoria Pública, secretarias municipais ou demais associações que, dentre suas finalidades institucionais, atue na proteção dos interesses e a promoção de direitos da pessoa com deficiência.

“O Ministério Público é o mais acessível guardião, pois as Promotorias de Justiça estão em todas as comarcas, facilitando a denúncia e a abertura de procedimentos administrativos preliminares cabíveis. Esse órgão também tem agilidade no acionamento das estruturas municipais para eventual intervenção, de acordo com a gravidade de cada caso”, explica Gruber, sendo que o mesmo vale para os casos em que o condômino com transtornos psiquiátricos mora sozinho.

Rede assistencial

A saúde pública do município disponibiliza os Centros de Atenção Psicossocial (CAPs), que atendem pessoas com transtorno mental severo e persistente e seus familiares. Para os autistas, o mais indicado é procurar apoio na Associação de Amigos do Autista (AMA) e nas Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (APAEs).

Lembre-se que o atendimento só é fornecido caso a própria pessoa busque ajuda ou algum familiar. Para síndicos e comunidade em geral, os órgãos podem dar orientações gerais de posturas, comportamentos e tirar dúvidas, para que eles saibam auxiliar quando acontecer no seu condomínio situações parecidas.

 

 

via condomíniosc.com.br

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